A forma certa de terminar um namoro começa no início da
relação. Você não precisa cantar alguém para ser sua namorada já pensando no
fim. Não se trata disso. Você entenderá quando eu lhe contar sobre meu romance
com a Ana e como ele foi concluído. Sim, a palavra é concluído. Nosso amor é como
um livro. Ele acabou de ser escrito, mas vende até hoje.
Eu e a Ana fizemos um pacto, como todo par recém-apaixonado.
Nos amaremos para sempre? Não, eu não era príncipe, nem ela cinderela. Fizemos
um tratado de virarmos as costas assim que o prazer de estarmos juntos
escapasse entre os dedos. Rápido, indolor e sem dramas.
O formalizamos em um restaurante, ao assistir um casal
sentado de frente pro outro devorar um filé ao molho de champignon sem emitir
uma palavra, além de “me passa o sal”. Havia uma tristeza mórbida naqueles
olhares que mal se cruzavam. Sentados lado a lado, entre cheiros no pescoço,
mordiscadas no lóbulo da orelha e risadinhas irônicas e debochadas,
convencionamos que aquela cena seria nossa linha de chegada. Seria o indício do
fim, concordamos Ana e eu.
Simples, contudo nada fácil. Durante três anos, eu e Ana
servimos como modelo de namorados. Eu era louco pela Ana e só conseguia
demonstrar plenamente quando mordia ela forte no queixo. Ela vertia lágrima,
mas eu não podia traduzir minha paixão silabicamente. Ana era fissurada por
mim. Sempre que o fim de semana desembocava no domingo à noite. Ana tentava
esconder o choro no banco do caroneiro quando eu a levava em direção à
rodoviária. Tinha dias que a gente simplesmente se respirava.
Ana foi meu amor mais amigo, meu relacionamento mais
tranquilo, a garota pela qual eu abriria mão de morar sozinho. Ana foi meu
abraço mais sincero, meu mais sério e divertido namoro, e estar longe dela me
dava uma agonia que eu gostava de ter. Ana foi meu sexo mais ardente, minha
risada mais gostosa, a mais deliciosa teia que já me prendeu. Aonde meus olhos
iam, levavam Ana à tiracolo. Ana me mostrou que eu não preciso ser sozinho. Ana
me fazia admitir ter motivos para viver por alguém. Ana foi uma noite com sol.
Ana foi. Assim que detectamos que nada mais havia a dizer.
Logo que começamos a vasculhar razões para sorrir. Pouco depois que nossa
transa deixou de significar poesia, taquicardia, suor e descoberta. Ana foi
quando o silêncio pairou entre nós dois no meio de uma pizzaria. Quando
provavelmente outros casais apontavam nossa embaraçosa quietude. Ana chorou
baixinho e eu ri de nervoso.
Nenhum namoro termina em comum acordo. Você e sua namorada
não chegam a conclusão que no dia 23 de julho, às 19 horas, três minutos e 40
segundos, o amor acabou. Todo namoro acaba porque o amado põe a mochila nas
costas e dá um beijo de adeus na testa do amante.
Mas até hoje nossa paixão é lembrada com alegria por quem
testemunhou. Até hoje ninguém acredita que um amor assim tenha prazo de
validade. Eu e Ana fomos o Pelé dos namoros. Encantamos a todos e paramos no
auge. Muito antes da frustração, de traição, da falta de respeito, da agressão,
da ânsia de vômito e de criarmos parentesco.
E é por isso que hoje eu ainda acredito no amor e quero
vivê-lo de novo. Porque com a Ana, eu tive tempo suficiente para aprender que
namoro é sinônimo de alegria, tesão e paz. E também porque me faltou tempo para
me entranhar que amar não vale a pena.
- Gabito Nunes in A manhã seguinte sempre chega